sexta-feira, 22 de julho de 2011

A Distância e o silêncio (Ele) (Ela)


Quando estava no multiply, nossa rede criou um projeto super criativo, Composição à vista de Gravura. A ideia era colocar uma foto e as mais diversas pessoas escreveriam contos inspirados nela. Só participei da primeira "composição". Mas foi logo com dois contos. A foto foi proposta por um dos contatos do multiply, Wagner.

Meus dois textos:

A distância e o silêncio (Ele)


Não... eu não estava só. Não naquele instante.
Naquele instante, silenciamos. Tanta coisa a ser dita e nada precisava ser dito.
Ela andava à minha frente. Parei. Não adiantava segui-la. O caminho já não era mais meu.
Ela continuou com seus passos lentos, leves e firmes. Não olhou para trás.
Por um momento, senti que ela hesitava. Mas não... era meu desejo que deixava seus passos ainda mais lentos.
Meus pés, presos a cada pedra, se despediam.
A cada pedra, a distância aumentava o meu silêncio.
Sim... estou só. Neste instante.


A distância e o silêncio (Ela)

Ele fala demais! Assim não consigo nem pensar...
Andávamos juntos e eu havia dito não pela primeira vez. Estranhamente, aquilo pareceu definitivo.
Ele continuava sereno, como sempre, mas não parava de falar.
Eu estava cansada, continuei andando. Ele ficou para trás. Eu andava lentamente e ouvi suas últimas palavras.
Percebi que andava sozinha. E que não mais o ouvia. Diminuí a velocidade dos meus passos, esperando uma frase, uma palavra, uma única palavra!
Nada ouvi.
Ao olhar para o chão, percebi que estava cada vez mais só.
Cada vez mais só.

quinta-feira, 21 de julho de 2011

Diálogo impossível: quem é Ken?

Diálogo clássico. Só poderia acontecer entre mim e meu sobrinho. Também não tenho como precisar a data, mas deve ter sido em meados de 2005.

Meu ponto de vista:
Titia, eu vou me fantasiar de quem no carnaval?(juro que ouvi uma interrogação)
É? De quem?
De quem? (continuo ouvindo uma interrogação)
Não sei, Paolo. De quem?
Quem usa um quimono laranja? (ah, que bom, ele está me dando uma dica sobre quem é...)
Ah, é? Quem é?
Quem!


A esta altura minha irmã está às gargalhadas. Finalmente eu entendo e Paolo também. Ficamos os três rindo do quanto sou sem noção. Aos poucos vou percebendo que sou alienada nos mais diversos momentos. Apesar de já ter visto meu sobrinho, Paolo, jogar Street Fighter algumas centenas de vezes, não me toquei que era do Ken que ele estava falando.




O possível ponto de vista do meu sobrinho:
Titia, eu vou me fantasiar de Ken no carnaval.
Ah, é? De Ken?
De Ken.
Não sei, Paolo. De Ken?
Ken usa um quimono laranja.
Ah, é? Quem é?
Ken!

Vida latente

Este texto é mais antigo do que 2005. Não tenho como precisar a data, mas foi inspirado em um dia do inverno carioca.






Sou um animal estranho. Os seres da minha espécie reconhecem-se entre si. Só sei que nasci entre eles porque vi fotos. Esse saber parece mais uma crença, afinal não tenho lembrança nenhuma desse passado. 

Aliás, mesmo vendo as fotos não consigo me reconhecer. Qualquer duplo meu dói. Passei a vida me sentindo e, hoje, descubro que tenho uma camada exterior. Uma casca? Não sinto como uma casca. Meus olhos dessa camada marejam. Abro os olhos. Não, não são meus olhos.

Semanas sem falar. Silêncio. Embora esse silêncio não signifique falta de comunicação. Será que minhas palavras vãs não necessitam de ouvidos? Dias andando pelas ruas. Ruas e calçadas. A cada rosto um ponto de interrogação: não os reconheço, ninguém me reconhece.

Serei eu um animal estranho?

Passo pelos caminhos, não me notam. Procuro minha caverna. Minha caverna está lá no alto, onde o ar é mais rarefeito. Subo a trilha, o ar vai ficando ralo e raro, vou tornando mais lenta minha respiração. Cada vez mais inspiro menos – e isso é proposital.

Finalmente, à minha caverna: meu metabolismo já está baixo o bastante para hibernar. Sou um animal estranho, apesar de não ver ninguém, peço licença para meu repouso.

Dormirei quarenta dias e, depois desse tempo, espero que apenas o sol esteja frio.

Unborn Love

O título é de um grande amigo, Marcio. A inspiração também nasceu de uma conversa lá pelos idos de 2005...

Alma minha, cicatriz...
fracasso que marca o
coração ferido
Quem se importa?

Eu fui uma criança
que morreu em mim
nasceu morta
quando você me morreu

Quem se importa?
Não se pode ver no escuro
No meu quarto, o vermelho sangra.
Se passa?
Não... a dor não passa enquanto eu não passar.

Se há fé

Em 2005, depois de profícua participação em uma rede multiply. Morri virtualmente e renasci com outra página. Até hoje, achava que os textos estavam perdidos. Hoje me deparei com eles. Essa sequencia de textos antigos estão aqui só porque gostaria de revisitá-los um dia.



Se há fé
em um grito que não se ouve
Se há fé
em alguém que não se vê
Há força
nos sussurros
Há vida
nas vigílias
Há sentido
nos chamados
E o invisível enfim se manifesta
E o inaudível enfim se torna ouvidos